Menos um Imprescindível
"There are men who struggle for a day and they are good.
There are men who struggle for a year and they are better.
There are men who struggle many years, and they are better still.
But there are those who struggle all their lives:
These are the indispensable ones."
Bertold Brecht
Este fim-de-semana perdemos um dos Imprescindíveis. Pedro, os nossos camaradas pediram que fizessem um texto sobre ti. Alguma coisa para ser publicada não sei onde com indicações da minha mãe que te conhecia melhor que eu, mas que fosse “uma aquelas coisas bonitas que eu sei escrever”. Eu disse que não. Com muita pena minha, recusei.
Um dia disseste-me uma das coisas mais bonitas que já me disseram sobre o que escrevo: “De muito bom gosto, só és pouco assídua”. Eu, sempre que me dizem isso, lamento e justifico-me com a falta de tempo, mas a verdade é outra. A verdade é que o que escrevo aparece antes na minha cabeça. Há um dia em que acordo e tenho um texto na minha cabeça. Não o faço sempre que quero nem consigo. Por isso é que acho que não é talento, é vontade. Hoje tinha um texto na minha cabeça. Era uma coisa que se me andava a desenhar há dias, desde que soube da tua partida, mas que estava muito enevoado ainda pelo choque e pela emoção. Hoje sai, espero eu. Vou tentar. Não será o texto que queriam que fizesse, com memórias alheias e com o tributo que tu mereces, mas sim aquilo que gostava que tu soubesses de mim, se ainda aqui estivesses.
Camarada, a nossa luta, a nossa causa ficou mais pobre. Perdemos um dos Imprescindíveis. Daqueles que fazem falta sempre, que sem os quais a coisa não anda da mesma maneira. Daqueles que me habituei a ver em qualquer circunstância nas várias casas que são também a minha casa, o PCP e a SOIR, aqueles sítios onde cresci e onde aprendi a ser pessoa, cidadã e comunista. Ser comunista não se aprende nos livros. Aprende-se no dia-a-dia, com os Imprescindíveis como tu, aqueles que sabemos que vamos encontrar sempre na luta e sempre que regressarmos a uma dessas casas.
Não vou dizer que levaste o melhor da vida e agora podes partir em paz. Viveste em pleno, acredito. Mas viveste pouco, ainda terias tanto para beber desta vida. Não me consolarei com esses lugares comuns que arranjamos sempre quando um dos que nos é querido parte. Partiste injusta e precocemente. O mundo continuará a rodar é certo e a vida continuará. Mas não da mesma forma e não com o mesmo brilho. Falta-nos um dos Imprescindíveis. Serás daqueles que ficará para sempre nas nossas memórias e cujas histórias (que provocarão sempre as melhores, as mais ternas e mais sinceras gargalhadas) evocaremos para contar aos netos. De agora em diante haverá sempre uma lacuna nas casas que partilhei contigo, no sítio onde antes morava o teu sorriso aberto, a tua presença desengonçada e a tua prosa cómica. A nossa Joaquim António será mais melancólica, pelo menos para mim e no PCP, em todas as campanhas, todas as manifestações, todas as lutas que travarmos daqui para a frente faltará a força que cabe a um dos Imprescindíveis.
Até Amanhã, Camarada Pedro Palma!
(Este era o texto que queria escrever. Acho que ainda ficou muito por dizer. O rascunho que tinha tão certo na cabeça foi-se apagando e tornando mais baço, talvez pelas lágrimas que agora escorrem pelo meu rosto. Talvez para uma próxima consiga algo mais preciso.)